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(pt) A BATALHA nº 197: As consequências de uma guerra no Iraque

From Worker <a-infos-pt@ainfos.ca>
Date Sat, 8 Mar 2003 22:46:25 +0100 (CET)


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por Manuel Baptista

I. Consequências económicas. A motivação dos EUA não é meramente
o petróleo, ou melhor, é a utilização do petróleo como arma para
vergar as economias concorrentes doutras potências do mundo dito
desenvolvido. Não se trata tanto do acesso directo a poços de
petróleo do Iraque, como de privar de acesso fácil e directo os
seus concorrentes da Europa Ocidental e Extremo Oriente (Japão e
Coreia).
No caso de guerra contra o Iraque, vai dar-se um aumento do
crude no mercado mundial para valores entre 40 e 50 dólares por
barril. Esta subida não poderá ser compensada, para a maioria
das economias da Europa Ocidental, com recurso a fontes
próprias. Será excepção a Grã-Bretanha, com o petróleo do Mar do
Norte, o que explica muito do posicionamento de Blair. Os
restantes países, verão as suas economias depauperar-se
rapidamente e passarão de um  crescimento modesto, para uma
recessão acentuada.  As consequências, para os regimes
“democráticos” da UE, são de todo imprevisíveis.  Mas uma coisa
é certa: os EUA estão apostados em que a UE e o euro se afundem.
Porquê?
Aqui, é necessário explicar como funciona o sistema financeiro
mundial. O dólar é a principal moeda de intercâmbio e de
comércio mundial. Isto tem como razão profunda a confiança quase
cega que investidores, das pequenas poupanças aos grandes
potentados do petróleo (detentores de “petro-dólares”...), têm
na meca do capitalismo mundial, os EUA.
Baseados nesta  situação, os dirigentes verdadeiros dos EUA
“inventaram” um meio de viver e fazer viver as camadas
privilegiadas do seu país, à custa do resto do mundo.
Desde há vinte anos que o défice comercial dos EUA se acentua,
sem que estanque o afluxo  de capitais a Wall Street.  Mas a
situação começou a inverter-se desde Abril de 2001. As bolsas e
mercados de capitais dos USA deixaram de ser tão atraentes para
os investidores, há preferência acentuada por outras paragens...
nomeadamente europeias.
A pretexto do 11 de Setembro, mas na realidade para favorecer a
indústria “high-tech” e de armamentos, a administração Bush está
apostada em investir pesadamente em programas de investigação em
armamento, o que acentuará o défice orçamental. Percentagem
abismal dos impostos vai parar à indústria de armamento, que tem
recebido encomendas do Estado para programas de “guerra das
estrelas” e para nutrir os já repletos arsenais de armas
“convencionais”.
O principal artigo de exportação dos EUA é armamento. Por isso,
é necessário fomentar guerras para manter a clientela e escoar
os stocks.
Com o nascimento do euro, começaram a modificar-se os dados do
problema: este pode tornar-se amanhã a principal divisa nas
trocas comerciais mundiais, destronando o dólar. Isso é apenas
uma hipótese, mas  tão grave para o papel hegemónico do capital
financeiro US, que este se considera ameaçado.
Saddam lavrou a sua própria sentença quando, em 2000, converteu
as suas reservas de dólares em euros.  Isso fez soar o alarme
nos “think tanks” do Império. Se tal exemplo viesse a ser
copiado pelos restantes exportadores de petróleo – com grande
excedente em dólares, devido ás royalties da venda do crude –
iria gerar um enfraquecimento do dólar, donde um refluxo de
capitais, uma fuga mesmo... Seria a derrocada do poderio
financeiro US sobre o sistema capitalista mundial. A Europa
tornar-se-ia então receptora mundial dos excedentes de capitais
gerados nas economias do resto do mundo.
Eis um poderoso motivo, sempre ocultado, para este furor bélico
nos EUA: tem a ver directamente com a enorme fragilidade da
economia US, neste momento.
Em termos de economia real, a situação nos EUA é mesmo de
recessão. Os principais índices de consumo são péssimos.  Porém,
o crédito ao consumo está baixíssimo, apenas se pode comparar o
seu custo com ... o início da década de 60!
Enron, Worldcom, etc apenas são os “monstros” emblemáticos da
crise. Há uma catadupa de falências, nomeadamente em grandes
transportadoras aéreas e noutros sectores antes julgados
“sólidos”,  independentemente da sensatez e “honestidade” dos
seus conselhos de administração!
Despedimentos colectivos nas grandes corretoras e nos bancos,
com muitos indivíduos da classe média alta a procurarem em vão
emprego após falência ou despedimento atingindo sectores
inteiros das empresas, incluindo seus quadros superiores... eis
o quotidiano da exangue “nova” economia...
Não há esperança dos capitais especulativos continuarem, no
curto prazo, a alimentar no mesmo grau a economia US. Foram
atraídos de todo o mundo, fornecendo capitalização bolsista às
empresas “high tech” : a famosa bolha especulativa. Não há
mezinha do FED que permita paliar este descalabro.
O governo Bush depende ainda, em grande parte, da adesão daquele
conjunto de cidadãos americanos que, em vinte anos de vacas
gordas, se viciaram no sobreconsumo e sobre-endividamento
descomunais.  As produções industriais do resto do mundo só
tinham um objectivo, nestes anos: exportar para os EUA,  para
satisfazerem o apetite desta camada insaciável (cerca de 5% das
famílias).
Perante tal quadro, a “solução” guerra tem sido insistentemente
apontada como saída por aqueles que manobram os lobbies mais
poderosos dentro da administração Bush.

A nível económico, a guerra tem como função travar a enorme
descida do poder aquisitivo nos EUA, dando uma “chicotada” nos
sectores de ponta associados à industria de armamento (o
complexo militar industrial). Por arrastamento, outros sectores
seriam também estimulados. Claro que isto se faz á custa de
enormes somas vertidas do orçamento federal, causando um défice
orçamental muito acentuado, com tendência a aumentar. Veja-se a
megalomaníaca corrida aos armamentos que é o programa conhecido
como “guerra das estrelas”. O orçamento da defesa actual atinge
somas, em valores constantes, muito mais elevadas que as dos
piores anos da guerra fria!
Isto é o que se costuma designar como “keynesianismo de guerra”.

II. Consequências geopolíticas.  Com o chamado “eixo do mal”
surgem os inimigos declarados do Império, como forma de impor
sua hegemonia sobre as restantes potências. Porquê?
Comecemos pela Coreia do Norte: desta trágica sequela da guerra
fria, esperam obter um meio eficaz de chantagem permanente sobre
o Japão, a Coreia do Sul e, sobretudo, a China.
  Se Pyongyang se mantiver uma ameaça “credível” aos olhos dos
japoneses e coreanos do sul, não haverá dificuldade em manter as
tropas US nestes países. Os EUA manterão essas plataformas
convenientes de ataque, quer em relação à China, quer em relação
a países da Ásia do Sudeste que se lembrem de desafiar o
Império. Era justamente aí que estavam as principais bases de
apoio logístico na guerra  da Indochina (de 65 a 75)!
Quanto ao Irão: O regime dos ayatolahs humilhou os EUA, forneceu
uma base recuada para grupos islâmicos chiitas como o Hezbollah,
que têm sido protagonistas contra o principal aliado de
Washington na região, Israel.   Forças do Hezbollah fizeram
recuar Israel, pela primeira vez desde há muito, abandonando
posições no sul do Líbano. O Irão é quem está mais próximo de
possuir armamento nuclear,  dentre os inimigos de Israel, logo
dos EUA, tendo a tecnologia necessária, os cientistas, além da
riqueza do petróleo.
O ter havido uma abertura e uma laicização tímida desse regime
teocrático, não é de molde a tranquilizar os EUA, pois a
aproximação ao seu ex-inimigo, tornou-se real após a Guerra do
Golfo. Os restos da aviação iraquiana refugiaram-se em
território Iraniano no epílogo desta guerra.
Finalmente, o Iraque:  É o inimigo mais conveniente a abater a
seguir ao Afeganistão, por vários motivos.
Com o ataque e ocupação do Afeganistão, os EUA meteram “uma
cunha” entre as republicas petrolíferas da Ásia Central  e as
potências que ainda são a Rússia e a China.  A guerra do
Afeganistão teve como principal motivação, destruir a aliança
que se estava a forjar entre a Rússia, a China e as referidas
repúblicas da Ásia Central, a qual chegou a ter um princípio de
concretização com a assinatura de um protocolo de ajuda mútua
assinado em Xangai, onde estes países se comprometiam a trocar
informações, a conjugar vigilância das fronteiras, com meios
militares comuns, etc. para  “combater o tráfico de ópio e o
fundamentalismo islâmico” mas, na realidade, com uma ambição
muito maior, não confessada: a de constituir um eixo
euro-asiático, no campo diplomático, económico e militar.
Por outro lado, tornava-se necessário dissuadir os “aliados”
fundamentalistas sauditas de protegerem à socapa as redes da Al
Quaida. E dar-lhes um sério aviso de que seria extremamente
perigoso imitarem  Saddam, trocando suas enormes reservas de
dólares por euros...
O regime de Saddam Hussein  não foi derrubado em 91 porque o
general Schwarzkopf recebeu ordens directas de Bush pai para
parar a sua ofensiva “às portas de Bagdade”... Convinha um
ditador enfraquecido politicamente, isolado no Mundo Árabe,  num
país esmagado sob um pesado fardo de sanções. Para servir como
exemplo a não seguir.
 Isso foi visto, aliás, como a única solução consentânea com os
interesses imperialistas, visto que a partição formal do Iraque
em três zonas (uma “cantonização” da Bósnia em escala maior) com
um Norte curdo, um Sul chiita e um Centro sunita, iria criar
instabilidade nos vizinhos aliados, Turquia e Arábia Saudita.
O Iraque era, sem dúvida, um apoio importante à resistência
palestiniana. Por isso, começou a ser planeado o derrube do
regime de Saddam, para que Sharon pudesse levar a cabo a
“solução final” em relação ao povo mártir da Palestina: a
deportação em massa. Foi com base nesta esperança louca e
criminosa que Sharon se fez reeleger por um eleitorado sionista
fanático e/ou atemorizado pelos ataques suicidas.
Importa esclarecer que o apoio indefectível dos EUA de Bush aos
desígnios genocidas de Sharon tem contornos de política interna
americana muito importantes: os fundamentalistas cristãos dos
EUA, base do seu eleitorado, optaram por uma mudança de alianças
que permitiu congregar parte da comunidade judaica, no apoio ao
candidato republicano. Os judeus americanos tinham como
principal preferência eleitoral o partido democrático. Vários
lobbies judaicos ainda têm ligação a este, mas essa ligação
deixou de ser exclusiva. A oposição democrática,  no senado e na
câmara, deixou-se enredar na operação “cruzada patriótica contra
o terror”, votando todas as leis que fazem do regime actual dos
EUA uma autêntica farsa de “democracia”, anulando, na prática,
os direitos civis.
Após a “eleição” de Bush, ele e o seu séquito não se poderiam
sustentar com menos do que com um “11-09” e o ataque subsequente
 aos mais elementares direitos dos cidadãos! O apoio ou
“neutralidade” dos lobbies da comunidade judaica no que toca à
inflexão fascizante do regime dos EUA foi negociado, tendo como
moeda de troca o apoio sem restrições a Sharon.
É muito provável que Sharon possa levar a cabo uma “blitzkrieg”
contra os restos da autoridade palestiniana, depondo, expulsando
ou assassinando Yasser Arafat, durante ou logo após a
“blitzkrieg” que irá ser desencadeada pelos seus patrões dos EUA
contra o Iraque.
A jogada geo-estratégica dos EUA com esta guerra,  visa assim:
(a) neutralizar  a possibilidade futura de um eixo Rússia –
China; (b) isolar o regime do Irão, com vista a seu eventual
derrube; (c) obter o controlo directo e permanente da região
onde se concentram as maiores reservas petrolíferas; (d)
liquidar de vez a “questão palestiniana”, estando Israel, sempre
pronto a levar a cabo uma guerra contra os vizinhos menos
dóceis, como cão de guarda  do Império.

III - Consequências humanitárias e ecológicas.  As guerras
contemporâneas caracterizam-se por serem dirigidas contra as
populações civis,  mais do que contra os exércitos em contenda.
Com as guerras mais recentes,  no Golfo, Balcãs e Afeganistão, a
situação ainda piorou: com o predomínio tecnológico militar
quase absoluto dos EUA, a estratégia tem consistido na opção
“zero”... zero vítimas para as forças imperiais, entenda-se.
Isto inclui um tipo de bombardeamento designado por “carpet
bombing”:  saturar de bombas uma região, aniquilando quantos aí
se encontrem. Trata-se de genocídios planeados friamente,
acrescentando uma dimensão apocalíptica ao crime que a guerra é,
sempre. Isso foi usado no Afeganistão como  fora no Vietname.
Em relação ao Iraque, o plano de batalha dos EUA incluirá uma
investida de 800 mísseis cruzeiro nas primeiras 48 horas sobre
Bagdade (o dobro dos mísseis que a atingiram durante toda a
guerra de 91!), não deixando nenhum lugar intacto. Bagdade,
segundo estimativas recentes, teria duplicado para 8 milhões nos
últimos anos.  As agências humanitárias da ONU, no Iraque,
apontam para  900 mil a dois milhões de vítimas directas das
acções bélicas, numa população de 24 milhões.  Muitas mais serão
causadas pela ruptura de abastecimentos, pela ausência de água e
de saneamento básico, etc. devido a fome aguda,  epidemias,
total ausência de socorros a feridos e doentes, etc.  Este
número não pode ser calculado facilmente, pois depende de
circunstâncias fortuitas, mas não é exagero considerar que
ultrapasse o número de vítimas directas das acções de fogo.
O clima iraquiano irá deixar uma população errante e sem meios
de subsistência sob um sol abrasador, procurando refúgio em
zonas fronteiriças dos países vizinhos... tão ou mais inóspitas
que os desertos iraquianos. Haverá portanto uma população enorme
de refugiados.
Do ponto de vista ecológico, haverá perigo de incêndio acidental
ou propositado de poços de petróleo, causando fumos negros
espessos, com libertação para a atmosfera de muitas toneladas de
anidrido de carbono e também de partículas cancerígenas. O ar, a
muitos quilómetros de distância, será irrespirável durante
muitos dias.  Os cursos de água,  poços, pântanos (zona do sul)
e mesmo o mar, ficarão seriamente contaminados.  As águas não
tratadas serão portadoras de doenças, desde as epidemias de
cólera (mortal na ausência de tratamento médico imediato) até às
doenças cancerígenas... que se irão manifestar a longo prazo.
Cabe frisar os efeitos cancerígenos e mutagénicos dos armamentos
e bombas com urânio “empobrecido”:  na realidade trata-se de
verdadeiras “bombas nucleares sujas” pois deixam aerossóis com
partículas cancerígenas em suspensão. Quando inaladas, irão
acumular-se nos pulmões e outros órgãos, causando cancro. Após
algum tempo na atmosfera, irão depositar-se nos solos,
tornando-os impróprios para a agricultura. A população
depauperada não terá outra opção, senão continuar a cultivar e
consumir alimentos vegetais ou gado contaminados, sendo de
prever enorme contaminação por elementos radioactivos,
especialmente trazidos pela cadeia alimentar, ao longo muitas
décadas *.
Zonas naturais de grande interesse ecológico, como estuários
outras serão gravemente perturbadas. Também o serão, as vastas
regiões semidesérticas, nas condições climáticas aí prevalentes,
onde os equilíbrios são muito frágeis, devido às altas
temperaturas do Verão e à sua secura.
O património, incluindo património da humanidade, será arrasado
de modo irreparável e sítios arqueológicos destruídos e/ou
pilhados. É o berço da primeira civilização agrária e dum rico
passado cultural. Bagdade é  tão importante para o Mundo Árabe,
como Paris ou Londres para a Civilização Europeia..
As ocorrências atrás referidas, são as que adviriam dos planos
de batalha do Pentágono e não incluem, portanto, as resultantes
do alastramento da guerra a outras regiões, fora do Iraque.
Considera-se provável  um acréscimo de repressão sangrenta ou
mesmo genocídio, por  Israel, nos Territórios ocupados da
Palestina, vagas de atentados terroristas em todo o Mundo, etc.

* Os referidos isótopos de urânio têm um período radioactivo
muito longo; ficarão muito tempo nos solos, sendo eliminados por
infiltração em profundidade do urânio dissolvido na água. Aí
será “desactivado” pelos  microorganismos do solo.




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